domingo, 5 de março de 2017
Mulheres-objetos
Como um fã de trocadilhos (me julguem), eu sempre fiquei intrigado com o quanto os nomes de algumas profissões denotam o machismo inerente a elas, como se fosse um surpresa serem exercidas por mulheres em algum momento da história. E talvez seja mesmo. Como se às mulheres coubessem apenas as carreiras de "dona de casa" e "empregada", já que ambas mudam completamente de sentido quando passadas para o masculino.
Da mesma forma, no sentido inverso, quando uma mulher quer ter a mesma profissão de um músico, por exemplo, a ela resta ser chamada de "música" e, assim, ser igualada ao seu objeto de trabalho. Há quem diga ainda que é possível usar o péssimo "musicista", que serve igualmente para homens e mulheres, embora eu duvide que quem sugere isso utiliza tal substantivo para falar de músicos homens. (Não, chamar a classe de "músicos mulheres" não resolve. Definitivamente, não.)
Enquanto um homem pode se tornar técnico em alguma coisa, a mulher será a própria "técnica". Um homem pode se tornar um político, mas uma mulher será, no máximo, uma "política", o que hoje em dia não é lá muito elogioso.
Se um homem pode ser crítico de cinema, a mulher que tiver a mesma atividade será reconhecida como a própria "crítica", sem que isso seja considerado uma ofensa a ela. Um representante do gênero masculino que passe no concurso público para os Correios poderá virar carteiro, mas só a mulher será chamada de "carteira", mesmo que ela ganhe menos do que o homem que desempenha a mesma profissão.
Você entrega seu carro ao mecânico, mas só pensa na "mecânica" quando se refere à técnica a ser empregada (olha elas aí de novo) em sua oficina. Um torneiro (mecânico, se quiser ser lembrado por todos, pode ainda virar Presidente da República. Já da "torneira", só lembramos quando a água acaba. Por isso mesmo, elas estão em alta hoje.
Um homem que decida animar festas infantis até poderá se tornar um mágico, mas a mulher terá que se transformar na própria mágica para ter a mesma atividade. Da mesma forma, ocorre com a química, a física e matemática, todas mulheres e referidas com letra inicial minúscula, inferior às próprias disciplinas acadêmicas que dão nome às suas profissões.
Mesmo quando falamos de profissões "tipicamente" femininas considerando o padrão conservador, as mulheres são confundidas com objetos. Nas escolas de horário integral, quem faz a refeição das crianças são as merendeiras. Nas escolas particulares, são elas que transportam o lanche da molecada, que as carrega penduradas pelas mãos. Quando aparece um "merendeiro", ele rapidamente é alçado aos títulos de "cozinheiro" ou "chef de cozinha".
O preconceito se manifesta mesmo em profissões menos valorizadas: enquanto o homem que trabalha em portaria é chamado de porteiro, a mulher que desempenhar a mesma função será equiparada à própria "porteira" do prédio. Um homem pode ser churrasqueiro, embora seja a churrasqueira quem faz o trabalho duro. Não à toa, é o mesmo título que será dado à mulher que se atrever a assumir os espetos e facões para assar uma carne no domingo. Isso, sem falar no lamentável equivalente feminino para "lixeiro".
Até quando não há flexão de gênero no nome da profissão, há confusão. No mesmo edifício do porteiro e da porteira, podem trabalhar seguranças homens e mulheres. Mas, quando alguém falar "a segurança", será preciso um esforço a mais de compreensão para o ouvinte entender que estão falando de uma pessoa, e não do serviço prestado.
Não à toa, para assumir o comando de um país de regime presidencialista, a mulher se vê em dúvida sobre que nome dar ao próprio cargo, para não correr o risco de ser confundida com os antecessores, mas também para marcar posição, ao não utilizar o mesmo nome usado por eles.
Nisso, aliás, o Jornalismo é uma das profissões mais igualitárias que existem, assim como a Economia e outras carreiras que são exercidas por profissionais cuja designação é encerrada em "istas", como desenhista, artista, dentista, acupunturista, e por aí vai.
Mas, só no Jornalismo, carreira em que as mulheres já predominam e em que todos são chamados igualmente de "jornalistas", a igualdade chegou aos salários, já que, sob essa desculpa, tanto homens quanto mulheres ganham igualmente mal.
Neste Dia Internacional da Mulher, só desejo que as mulheres deixem de ter suas carreiras confundidas com trocadilhos, e que ninguém mais se surpreenda quando uma mulher disser que ela pode ser tudo o que ela quiser.
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